Compliance – Detecção – Parte III

Nesta semana, uma das tubulações de água de minha residência se rompeu, drenando toda a água dos reservatórios, tanto fria como quente, deixando a casa em pane seca. A denúncia inicial veio com a falta de água quente, a que sempre acaba primeiro, em função do desenho do sistema hidráulico. No entanto, este sinal poderia ter diferentes causas, sendo a mais corriqueira a falta de água na rede de abastecimento. Naturalmente, esta foi minha primeira aposta e esperança!

Tomei um rápido banho frio com o que ainda restava desta água, e dei uma saída. Mais tarde, ao chegar em casa, no silêncio da noite, podia escutar a água da rede abastecendo o reservatório, o que confirmava minha suspeita inicial e, de certa maneira, fortalecia a esperança de que não havia nenhum problema nas minhas instalações. Na manhã do dia seguinte, o borbulhar da água ainda caindo no reservatório, jogou por terra aquela esperança e foi o sinal definitivo de que algo não estava bem.

Escada nos ombros, lá vou eu para a torre verificar o que estaria acontecendo. Antes mesmo de chegar ao topo e abrir a caixa de água fria, já havia descoberto o tubo por onde a água estava escoando, pelo som de cachoeira que vinha do seu interior. Daí a identificar o ponto de vazamento não foi muito difícil, embora estivesse enterrado e a água se infiltrando pelo solo sem se deixar notar na superfície, pelo menos não do lado da minha residência.

Este pequeno incidente doméstico me remete à importância de um bom sistema de detecção, assunto que estou desenvolvendo nesta série de artigos. Se o vazamento fosse espalhafatoso, barulhento e à vista, seria imediatamente notado, corrigido bem mais rapidamente e a um custo muito menor. Como não foi este o caso, o tempo necessário para a investigação de todas as possibilidades e a reparação do problema foi grande, bem como a perda da água que se infiltrou pelo solo.

Da mesma forma, se desvios de conduta acontecessem na superfície e à vista de todos, seriam facilmente tratados e coibidos. Acontece que a realidade é bem outra. Estes desvios só se tornam evidentes depois de descobertos, e nem sempre são descobertos sem a cooperação de alguém que tenha percebido que algo não estava indo bem.

 

E a cooperação deste alguém não virá, se ele não se sentir plenamente seguro ao cooperar.

E ele não se sentirá seguro se o canal de denúncias não tiver a necessária credibilidade.

 

Voltando ao vazamento de água da minha residência, embora não fosse visível do meu lado da casa, uma grande mancha de umidade marcou o muro de arrimo do vizinho de baixo, denunciando claramente a sua localização aproximada. Isto me fez pensar que no dia a dia das organizações algo parecido acontece. Pessoas de uma determinada área, envolvidas que estão com suas responsabilidades, podem não perceber que alguma coisa está fora do lugar, mas alguém, de outra área ou mesmo de fora da organização, pode notar e relatar o que está observando. Neste caso, o meio mais apropriado para fazer o relato é o canal de denúncias.

No meu próximo artigo vou explorar os aspectos que conferem credibilidade a este canal, sem o que, ele não passará de uma ferramenta empoeirada e inútil, uma mera formalidade. Esta credibilidade, no meu ponto de vista, deve ser construída sobre três grandes fundamentos: primeiro a garantia de sigilo do denunciante; segundo, a rápida e efetiva tratativa do caso e, finalmente, um feedback adequado e transparente.

Sendo construído sobre estas bases sólidas, este canal precisa ser amplamente divulgado e sua utilização deve ser fortemente incentivada, não apenas aos de dentro da organização, mas a todos que, direta ou indiretamente, têm alguma relação com ela.

 

quer ler os outros post dessa série:

Compliance e Detecção – Parte I

Compliance e Detecção – Parte II

 

Autor: Jedaias Jorge Salum – Engenheiro Mecânico pela PUC-MG, com pós-graduação em Tecnologia de Obtenção de Celulose pela USP/IPT/ABTCP e MBA em Gestão Empresarial pela FGV Belo Horizonte. Atuou por mais de 34 anos na Cenibra, empresa do setor de papel e celulose, nos últimos 7 anos como Assessor da Presidência, responsável pelo Planejamento Estratégico, Comunicação Corporativa, Relações Institucionais, Gestão de Compliance, coordenador do Comitê de Sustentabilidade, do Comitê de Compliance e Gestão de Riscos e das Reuniões da Diretoria. Atuou na área comercial por 14 anos, tendo assumindo inicialmente a gestão da assistência técnica aos clientes, em seguida a Gerência Comercial, encerrando esta passagem como Gerente de Marketing e Assistência Técnica da empresa. Iniciou as atividades na Cenibra em 1982 como Engenheiro Projetista, tendo desenvolvido e implantado vários projetos industriais de aumento da capacidade produtiva. Em 1989 assumiu a Gerência do projeto da área de Recuperação e Utilidades da duplicação da fábrica. Iniciou sua carreira profissional na área de projetos mecânicos da Usiminas, onde trabalhou como projetista por mais de seis anos.