Compliance e Consciência – III

Em meu segundo artigo sobre este tema, disse que o comportamento compliance não será assegurado por controles e que há necessidade de uma nova consciência que impulsione e determine a boa conduta, independentemente dos próprios controles, o que estou chamando do estabelecimento de uma contracultura.

Não sou ingênuo ao ponto de recomendar a eliminação dos controles, esperando que num passe de mágica a nossa sociedade mude radicalmente o seu tradicional comportamento de levar vantagem em tudo, como exemplificado rapidamente naquele artigo. Os controles ainda serão necessários, uma vez que desvios de comportamento sempre foram observados em toda e qualquer cultura e em todas as épocas. Além disto, não temos nenhuma indicação de que os desvios cessarão num futuro minimamente previsível.

No entanto, os impactos de um comportamento non compliance podem ser reduzidos, as ocorrências menos frequentes e os controles podem ser mais simples, mais baratos e muito mais eficazes, se estiverem associados à proliferação e generalização de boas consciências, com irredutível disposição de acertar, de proceder bem, de agir corretamente.

Tomando esta premissa como verdade, o nosso grande desafio é promover e incentivar a formação de consciências saudáveis, sensíveis, vivas, ativas, que gritem e se façam ouvir diante de dúvidas ou decisões a serem tomadas. Se todos tiverem este tipo de consciência, amadurecida, pura, sadia, ligada e disposta a se pronunciar sempre e com o vigor necessário, os resultados serão encantadores.

Tenho visto organizações e instituições tomando caminhos muito parecidos na implantação da gestão de compliance. Via de regra, estabelecem uma política de compliance, um código de conduta ética, criam um comitê de conduta ética, definem um ou vários canais de denúncia, escrevem termos de compromisso que são assinados pelos funcionários, fornecedores, clientes e outros stakeholders, definem níveis de alçada cada vez mais restritivos e implantam sistemas de controle cada vez mais robustos. Este é um caminho que não tem fim e se trilhado na busca do risco zero terá custos mais e mais vultuosos. Esta solução pode restringir, mas não elimina as ocorrências do non compliance. No caso das consciências mais fracas, pode até servir como incentivo à busca de caminhos para burlar todo o sistema.

Estamos então, diante de um paradoxo, de uma balança de dois pratos: de um lado, as consciências e do outro, os sistemas de controle. Quanto mais fracas as consciências de uma sociedade, organização, empresa ou instituição, tanto maiores serão os investimentos necessários e mais robustos e sofisticados os sistemas de controle. Não seria sem sentido que as empresas passassem a adotar testes de caráter e de conduta aos candidatos às suas vagas de emprego e até mesmo aos próprios funcionários. Desvios de conduta seriam tratados com rigor cada vez maior, visando não apenas a correção e recuperação do infrator, mas ainda como exemplo de comportamento indevido e indesejado que não vale a pena ser seguido.

O desafio que precisamos encarar com toda energia possível, é de alinhar fileiras na formação de boas consciências, até que tenhamos estabelecida uma contracultura, na qual a lei de Gerson se torne tão repulsiva, que seus persistentes seguidores sejam um remanescente que não mais encontre ambiente para esta conduta.  Vamos materializar juntos este sonho!

 

Autor: Jedaias Jorge Salum – Engenheiro Mecânico pela PUC-MG, com pós-graduação em Tecnologia de Obtenção de Celulose pela USP/IPT/ABTCP e MBA em Gestão Empresarial pela FGV Belo Horizonte. Atuou por mais de 34 anos na Cenibra, empresa do setor de papel e celulose, nos últimos 7 anos como Assessor da Presidência, responsável pelo Planejamento Estratégico, Comunicação Corporativa, Relações Institucionais, Gestão de Compliance, coordenador do Comitê de Sustentabilidade, do Comitê de Compliance e Gestão de Riscos e das Reuniões da Diretoria. Atuou na área comercial por 14 anos, tendo assumindo inicialmente a gestão da assistência técnica aos clientes, em seguida a Gerência Comercial, encerrando esta passagem como Gerente de Marketing e Assistência Técnica da empresa. Iniciou as atividades na Cenibra em 1982 como Engenheiro Projetista, tendo desenvolvido e implantado vários projetos industriais de aumento da capacidade produtiva. Em 1989 assumiu a Gerência do projeto da área de Recuperação e Utilidades da duplicação da fábrica. Iniciou sua carreira profissional na área de projetos mecânicos da Usiminas, onde trabalhou como projetista por mais de seis anos.